“Natureza e sociedade devem ser uma coisa só”, relata professor indígena durante  Diálogos Avançados

Evento reuniu pesquisadores da UFSCar e USP, estudantes e a sociedade para debater os impactos da ação humana no Planeta

Texto: Gisele Bicaletto - 18/10/2024

As ciências diante do Antropoceno. Este foi o tema central do evento “Diálogos Avançados”, realizado pela primeira vez, em São Carlos. A atividade inaugurou a parceria entre o Instituto de Estudos Avançados e Estratégicos (IEAE) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e o Polo São Carlos do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. Entre os dias 15 e 17 de outubro, o evento reuniu um grande público entre pesquisadores, estudantes e a sociedade civil em mesas que abordaram diferentes aspectos sobre o papel da ciência diante dos impactos causados pela ação humana ao planeta Terra.


O termo Antropoceno,  apesar de ainda não ser um consenso  entre todas as áreas da ciência, tem sido utilizado para descrever o período mais recente da história do Planeta, caracterizado pelo impacto do homem na Terra. A proposta dos Diálogos Avançados  foi refletir sobre questões atuais como mudanças climáticas, perda de biodiversidade, crise dos recursos naturais e as desigualdades socioeconômicas exacerbadas pelo impacto humano e, para além disso, o evento se propôs a diagnosticar os problemas, e refletir sobre perspectivas que possam contribuir para um futuro mais sustentável e equitativo. “A intersecção entre ciência, tecnologia e sociedade foi um eixo central das discussões, enfatizando a necessidade de colaboração entre os saberes para enfrentar os desafios globais desse período”, afirmaram os organizadores. 


Adilson de Oliveira, diretor do IEAE-UFSCar, aponta que “a crise do Antropoceno mostra grandes desafios e que será modificada a partir das reflexões da sociedade, que precisa pensar sobre isso. O evento abre a possibilidade para as pessoas pensarem sobre essas questões e cobrarem políticas públicas para vencer o problema”, destacou ele, que reforçou o ineditismo da atividade. Maria de Jesus Dutra dos Reis, vice-reitora da UFSCar, aponta que o evento se configurou como um momento relevante para essas reflexões, principalmente no âmbito do processo de produção do conhecimento voltado para a responsabilidade social das universidades. “Nossas instituições têm maturidade para isso e, no momento em que a ciência é questionada, temos o compromisso de fazer essa revisão da nossa realidade”, reflete Reis.


Davi Sperling, vice-coordenador do Polo São Carlos do IEA-USP, aponta a relevância dos Diálogos Avançados como um espaço de reflexão, especialmente no tema escolhido nesta primeira edição. “Ainda que o termo Antropoceno esteja em debate, a era atual vem sendo caracterizada por um novo regime climático, resultante da influência significativa da atividade humana no Planeta, apresentando desafios complexos e interdisciplinares e  exigindo novas abordagens de diálogos entre diversas áreas do conhecimento”, pontuou, destacando o evento como espaço de reflexão sobre as implicações sociais, ambientais e éticas dessa nova era. Elisabete Assaf, coordenadora do Polo São Carlos do IEA-USP, ressaltou a importância da atividade e da parceria entre os institutos e destacou a atuação de ambos no estímulo a diferentes atividades, estudos e projetos de áreas distintas.


Roseli de Deus Lopes, coordenadora do IEA-USP, prestigiou o evento em São Carlos e afirmou o papel de destaque que os institutos têm dentro da UFSCar e USP, reforçando o evento como uma oportunidade de apresentar e disponibilizar o conhecimento produzido nas instituições. “Os conhecimentos gerados pelas universidades são cada vez mais importantes e, nem sempre, conseguimos induzir movimentos para esse conhecimento ser utilizado”, refletiu. Antes da palestra de abertura, Adilson de Oliveira e Roseli Lopes assinaram o termo de cooperação entre IEAE-UFSCar e Polo São Carlos do IEA-USP. A cerimônia de abertura (link externo) pode ser acessada no YouTube, 


Durante  a palestra de abertura, o convidado Casé Angatu, indígena e docente da Universidade Estadual de Santa Cruz (BA) e da Pós-Graduação em Ensino e Relações Étnico Raciais da Universidade Federal do Sul da Bahia, abordou a relação que seu povo mantém com a natureza e destacou que ela não deve ser vista de forma isolada da sociedade. “Nós somos a terra, esse é um princípio indígena. Nossa relação com a natureza é de respeito e em nossa natureza não tem exploração. Não somos da terra. Nós pertencemos à terra. Essa dicotomia - natureza e sociedade - não existe”, expôs. Angatu concluiu que a humanidade precisa manter uma relação de pertencimento à natureza e não de exploração. A palestra também está disponível e pode ser acessada neste link (link externo).


A programação do evento teve a apresentação de quatro mesas-redondas, conduzidas por docentes da UFSCar e da USP, que reforçaram o destaque da interdisciplinaridade para refletir e propor estratégias de enfrentamento aos desafios impostos às questões sociais, ambientais, econômicas e éticas, principalmente  a partir da contribuição das ciências.


A mesa 1, “De que falamos quando falamos de Antropoceno", foi  conduzida pelos professores José Eli da Veiga, professor sênior do IEA-USP, e Vera Alves Cepêda, docente do Departamento de Ciências Sociais da UFSCar, e apresentou interpretações e debates em torno do conceito de Antropoceno, que tem se tornado central nas discussões sobre a influência humana no planeta. A apresentação da mesa (link externo) pode ser conferida no YouTube.


O tema da mesa 2 foi “Biodiversidade, morte e vida das espécies”, apresentado por Hugo Sarmento, docente e pesquisador do Departamento de Hidrobiologia da UFSCar, e por Stelio Marras, professor e pesquisador em Antropologia do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. O tema tratou sobre os impactos na biodiversidade estão no uso do solo e a consequente destruição de habitats, além de mudanças climáticas, poluição e extração de recursos naturais de forma não sustentável. Além disso, houve o debate sobre quais atividades e quais humanos podem estar impactando negativamente o Planeta. A íntegra do debate está neste link (link externo).


Sonia Maria Barros de Oliveira, docente do Instituto de Geociências da USP, e Ernesto Pereira, professor do Departamento de Química da UFSCar, apresentaram a mesa “Vida e energia” e refletiram sobre como a exploração e o consumo de energia, desde os combustíveis fósseis até às energias renováveis, impactam diretamente os ecossistemas e a vida em todas as suas formas. A apresentação também está disponível aqui (link externo). O tema da última mesa do evento tratou sobre as profundas transformações ambientais e sociais geradas pela expansão urbana, especialmente no contexto do Antropoceno, refletindo alternativas para as cidades preservarem suas áreas verdes e ampliando as discussões sobre trabalhadores do campo e o êxodo rural, que tem raízes históricas. A mesa “Urbanização planetária: ecologias e desigualdades” foi conduzida por Marcel Fantin, docente do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP, e por Maria Aparecida de Moraes Silva, professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFSCar. A íntegra do debate (link externo) está disponível.

A proposta da parceria entre IEAE-UFSCar e Polo São Carlos do IEA-USP é promover anualmente os Diálogos Avançados, sempre com temas que reflitam os desafios da sociedade. Todas as informações do evento podem ser acompanhadas no site https://dialogos-avancados.org (link externo).